Como prometido, e como as televisões e jornais andam a
dizer, cá vamos nós a caminho da Guiné-Bissau. Para os mais distraídos, ou para
quem só aqui chega agora, o Fim do Mundo à Direita (sinto-me um jogador de
futebol, a falar na terceira pessoa) fez de novo as malas (ai malas...mochilas
e ainda mais pesadas que da última vez) e juntou-se ao pessoal da Missão
Dulombi para viajar em carrinhas até Dulombi, para levar comida, roupa,
brinquedos, material de hospital e todo o tipo de ajuda à população de lá.
A bagagem leva, ainda, a fotografia premiada pelo World
Press Photo, que o Daniel ali tirou na mesma missão, em 2012. É , por isso, uma
viagem com um sentimento especial.
Foto: Lisa Soares / Global Imagens
Bom, o propósito é muito lindo, mas nove dias de viagem por
países como Marrocos, Mauritânia, Senegal e Guiné-Bissau são, já de si, a
própria da aventura. Em vários sentidos: estradas, horas de viagem, calor,
fronteiras, regras muito suis generis, condições de estadia que deixam a
desejar e um grupo de 14 pessoas com perspetivas e resistências muito
diferentes.
Histórias de viagens são o nosso forte. E começam logo à
saída com um atraso de três horas causadas por...um bocado de ferrugem a lixar
o circuito de água de uma das carrinhas. O Macgiver tinha resolvido isso em
dois minutos, mas pronto.
Siga três carrinhas, mais 13 pessoas em direção a Campo
Maior buscar o 14º. A 80/h que não dá para mais, temos tempo e pode ser que as
fotos não fiquem tremidas. Felizmente, a sorte resolveu vir também e,
imagine-se!, consegui dormir. Está a ir bem.
Pela manhã, lá chegámos o primeiro ponto assinalado no mapa:
Tarifa, onde apanhámos o ferry para Marrocos. O árabe deve ser uma língua muito
linda, mas responder-lhes com o belo do português do norte é marabilhoso.
Pés em Marrocos, rumámos a Assilah, que engrossa o grupo
daquelas cidades pequenas, bem arranjadinhas, que acolhem bem esta gente que
passa tantas horas em viagem. Estacionámos num parque de campismo e fiquei para
a minha vida quando o Daniel me diz “Vamos ficar no quarto com o Chico e o
Vitor, ok?” Ein? Quarto? Daqueles com camas? E almofadas? Não sei se me
preparei para tanto luxo. Maravilha!
Pousar tudo e vamos é comer. E aqui começa o dilema de nos
fazermos entender verdadeiramente. É que conseguir que nos tragam uma coca-cola
natural é o cabo dos trabalhos. Claro que chamar a malta à parte para negociar
umas cervejas já é num instante, esquece lá o pecado, fazemos quilómetros para
a ir buscar aos confins das clandestinidades. Ai, salamaleques...
Ao final da tarde, fomos dar um passeio pela praia e não
faltaram campos de futebol para fotografar os craques. O Cristiano, esse, não
falha nas camisolas, muito menos o sorriso e a resposta óbvia à palavra
“Portugal”.
Assilah tem, ainda, uma pequena cidade dentro das muralhas
de um forte, que tem muitas parecenças com a Vila de Óbidos e dá para um
pequeno primeiro contacto com a arquitetura muçulmana e com a cultura desta
gente que não se deixa fotografar nem por nada. Cheira-me que ainda vamos sair
daqui com um olho negro. Isto na melhor das hipóteses.
Foi também aqui que vimos o primeiro pôr-do-sol africano,
aquele momento que acaba com qualquer bateria ou espaço de telemóvel. Ok,
Marrocos não é Àfrica, mas o sol deste lado do mundo é bem diferente do que já
vimos. Mal o sol desapareceu, eis o gelo das noites por aqui. E eu que achava
que trazer camisolas tão quentes ia ser um desperdício de espaço. Ca frio!
É frio, mas é preciso tomar banho que já são muitas horas
com a mesma roupa. Água quente a sair às pingas, mas não há lugar a queixas.
Tenho para mim que é do melhor que vamos encontrar e, na verdade, soube quase a
jacuzzi. Nessa noite, o sono que fizemos foi a melhor coisa do mundo.
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